quinta-feira, 30 de abril de 2009

Critérios sociais e sobre exercer medicina hoje: esboços


Muitos se perguntam "qual a utilidade da filosofia?" e esperam que a resposta seja parecida com a que pode surgir de "qual a utilidade da física/química/biologia/medicina [e aqui poderíamos incluir tantos outros]?".

A própria questão nos aponta que a filosofia não pode se encontrar no mesmo nível de contribuição que as ciências mais passíveis de aplicação e de resultados práticos, que significam mais conforto material, mais facilidades, mais alimentos. A filosofia não trabalha nesse sentido, pelo menos não diretamente.

Eu mesmo, tenho que admitir, não sou pessoa indicada para dar qualquer consideração bem séria sobre a utilidade ou função da filosofia. Muitos temos visto que realizaram a tarefa de forma tão complexa que seria preferível trazer-lhes o pensamento e comentar-lhes. Mas infelizmente esta não é a intenção deste texto.

Diríamos nós, a respeito da filosofia [e não dizemos por nós mesmos unicamente, mas a cultura filosófica fala pela nossa boca], que estuda conceitos, revisa e institui critérios. Isto inclui, é claro, a incansavelmente afirmada "atitude crítica". E deixemos qualquer provável discussão sobre o que vem a ser "crítica" para outro momento.

Por isto nossos manuais de filosofia nos dão conta de que ela é radical e racional: esforça-se no sentido de promover debates que não permaneçam na superfície, mas que intentem chegar à raiz do problema, revelando sua profundidade. Este processo é, com efeito, grande construtor de conceitos, criando novas perspectivas, metologias de análise. É como se a filosofia proporcionasse, ao estudioso de outra área do saber, uma subida à tona, para respirar novos ares. Estes mergulhos, entretanto, sempre estão disponíveis ao debate social, à outros novos olhares.

Suas contribuições, se devemos encontrá-las na utilidade imediata, estariam principalmente na ética. Principalmente quando a palavra é usada para nomear um "comportamento correto", sendo corriqueiro e fácil usar expressões como "anti ético". Mas a ética poderia ir além, e seu substrato encontramos nos grandes filósofos clássicos. Apesar disto, a ética têm sido visada pelas instituições de uma forma geral e isto pode ser considerado um avanço em termos de consciência, já que muitos pensadores associam por elos estreitos pensamento e instituições.

Mas mesmo a institucionalização da ética não livrou a sociedade da constante necessidade de rever seus critérios. Um destes critérios que gostaria de citar e tentar avaliar é aquele usado pelas instituições de nível superior. O vestibular, como o próprio nome nos indica, é a principal ou única entrada para as universidades e faculdades. Apresenta-se na forma de um teste de inúmeras perguntas, divididas em objetivas e subjetivas e por disciplina. Os candidatos ao título de universitários deverão demonstrar seus conhecimentos respondendo e acertando à tais questões e até aqui não expusemos nada de novo, só tentamos deixar às claras de que é feita a entrada no meio acadêmico.

É então que algo de estranho nos ocorre e desconfiamos por um momento da objetividade das questões. Cumpririam seu papel de diretismo e precisão? Segundo nossa limitada ótica, não. A brevidade das questões objetivas é o primeiro obstáculo, diminuindo o sentido das questões e, consequentemente, das possíveis respostas, que por sua vez, limitam-se a alternativas de extensão limitadíssima em alguns casos. O segundo obstáculo é justamente esta limitação na possibilidade de respostas e de discussão até da própria questão proposta. Admitindo-se que entre os objetivos das universidades temos o de formar cidadãos críticos, é como se as universidades quisessem recrutar os piores para torná-los melhores.

Neste sentido, a quase recente prova de redação e as perguntas subjetivas são um salto à frente. Mas por quê nos referirmos à perguntas objetivas e subjetivas, quando, na verdade, é o sujeito que responde às duas? Chegamos à conclusão que tal distinção não tem valor teórico, guardando apenas um valor classificatório. Em algumas perguntas podes dar sua própria resposta mas em outras não. Limitante?

É assim que nas universidades encontramos drogados de todas as classes e tipos. Mesma variedade encontra-se no caráter dos sábios e/ou profissionais do nosso futuro. E os primeiros não contentam-se com a maconha, a cocaína e o sagrado álcool [sagrado por quê ninguém ousaria tocar na possibilidade de sua abolição nos meios sociais], mas, pelo contrário, optam pelas mais originais formas de narcose. Nossos futuros profissionais da saúde, nos dizem as notícias televisivas, são pioneiros em usar substâncias inusitadas para tal fim.

Entre outros, temos candidatos à médicos drogando-se no seio das instituições que deveriam propagar o saber, a pesquisa e suas distribuições em "feedback" para o social. Ser médico deve ser realmente uma profissão muito estafante; plena de responsabilidades; de obrigações para com os manuais de anatomia, fisiologia e similares; de obrigações para com os pais, frequentemente responsáveis pelos custos de formação tão melindrosa.

Mas o prestígio social e a segurança financeira bem acessível constituem moeda razoavelmente compensativa, deveremos convir. Que é ser médico? A resposta é bem simples e ser médico é tratar da saúde d'agente. Toda gente? Não. Só as que podem pagar. As que não podem morram à míngua, pois o médico deve trabalhar apenas por aquilo que lhe é pago em recompensa. É assim que a vida de muitos médicos resume-se a sair da universidade, com uma especialização, quem sabe, montar seu próprio consultório e ganhar seu suado dinheiro.

Bem como advogados, os médicos costumam ser cruéis no saldo de suas consultas, mas não adianta correr para os planos de saúde na tentativa de encontrar à disposição um bote financeiro pronto para o salvamento. Nem os planos de saúde encontram-se livres da ganância e da má administração, pelo menos no Brasil. Não temos muitos médicos, então marcar uma consulta com um especialista da área costuma ser tarefa difícil e exige paciência e perseverança, muitas vezes as agendas estão lotadas.

Por quê tão poucos médicos? A formação médica é tão cara assim ou estamos dando valor em demasia à categoria? Optemos pelo estudo da primeira hipótese. Poucos, ocupados e prestigiados médicos: quantos deles? Não tendo a quem recorrer, são eles, em muitos casos, nossa única saída e chamamos aos médicos pomposamente de doutores. Sobre a primeira hipótese vale que lembremos a proposta/programa freiriano, resumido sob a fórmula "de pé no chão também se aprende a ler"; então a formação médica é sofisticada neste sentido, mas essa é uma questão didática.

A pergunta feita no parágrafo anterior, nos remete mais uma vez ao aspecto econômico da formação médica. E por outro lado nos inclina a pensar que muitas vezes que atuar na medicina é como ter a possibilidade de juntar grandes somas em dinheiro e ganhar posição na sociedade de forma relativamente fácil. Onde estão os valores que nos levam ao labor das profissões dignitantes? É prudente usar a "estabilidade econômica"[entre aspas por que a estabilidade econômica é bem menos do que se pode alcançar neste sentido]?

Trabalhar em prol da saúde deve ser trabalhar em prol do coletivo, não apenas em prol do bem estar individual. Ser um bom médico pode ser um médico comum, como descrevemos à pouco, mas somos ganaciosos e queremos sempre mais. Toda esta crítica, que pode na verdade estar causando muitos mal-estares é antes um convite aos valores originários da medicina e realizar aprofundamento à questão aqui seria especular a respeito de Hipócrates. O estudo da teoria médica antiga pode nos fornecer muitas luzes para a prática médica no mundo contemporâneo e quem nos diz é um próprio médico, Luiz Roberto Londres, em seu livro "Iátrica: a arte clínica". Aprofundemos em outra oportunidade.

Atuação e permutas: conduta de gênero


Admitir a condição de nossa sexualidade é muitas vezes embaraçoso. Se nos posicionamos como heterossexuais, logo somos forçados a demonstrar que não mentimos. Os dispositivos provacionais para a heterossexualidade no contemporâneo vêem se sofisticando[?] e ganhando espaço, principalmente entre os jovens. Com excessão de movimentos menos bruscos na sexualidade, tais como emos [que admitem a bissexualidade com uma naturalidade quase normativa] ou punks [que por sua vez preferem a anarquia como parâmetro, não restando muitas restrições], a sociedade quer ver, com seus próprios olhos se seus rebentos não são "machos" o suficiente. Por quê, claro, ser homem, ou melhor, interpretar um homem exige um figurino, um roteiro e falas próprias para que não haja confusão e para que ao final o público possa aplaudir de pé.

Constitui-se ridículo evento a quebra do decoro fálico. Palavrões, por exemplo, sejam largamente admitidos nos scripts dos candidatos. Intolerância também não pode faltar-lhe e tem ele a obrigação de dar o troco na mesma moeda. A mulher, ah, a mulher! Deve ser sua serva e sua contraparte, seu avesso, sendo ele o mandatário e ela sua executora; sendo ele a brutalidade e ela a brandura e etc... não nos demoremos aqui, pois este roteiro nós o temos em mente mui bem, seja com indiferença ou pesar...

Se o macho resolver desenvolver em si a tolerância, se vestir-se de forma menos quadrática, se for mais compreensivo e amável, inclusive com sua esposa, copiando-lhe o feminíssimo hábito de cuidar da casa, estará com seus dias masculinos contados, pois não interpretou bem o seu papel. O público, quando apático ao péssimo espetáculo, deixa os assentos com pesar e lástima. Mas quando o publico se indigna do horror a que assiste, joga podres tomates, num ato de depreciação ao ator incompetente. Esqueceu o texto, e se não esqueceu, pior ainda, o omitiu.

Não se pode, segundo tal roteiro, ser macho longe de bares e, em bem menor grau, de prostíbulos. Pinga nossa de cada dia nos dai hoje para que possamos expurgar nossas angústias, mui custosamente contidas [e é assim que "beber para afogar [ou esquecer] as mágoas" ganha um efeito bem expressivo], permitindo que tenhamos a possibilidade de deixar a nós mesmos para habitar um mundo de narcose, mesmo que temporário e mesmo que tenhamos muita ressaca no dia vindouro.

Por outro lado, que estranho! Meninas ou mulheres são agora designadas como "nêgas". Deixaram de ser Maria, Joana, Lúcia, Andréia [e até mesmo "mulheres"] e passaram a ser tanto objetos tanto de prazer quanto parâmetros adotados a fim de medir quanto vale um homem. Jogamos estranho jogo pois no score [o número de negas contribui muito para uma boa colocação no ranking] de cada participante percebemos pontuações astronômicas sem, no entanto podermos localizar e identificar os jogadores. É um jogo de fantasmas e de sombras.

Se afirmamo-nos como bissexuais então somos indecisos ou covardes. No mundo hetero ou homo é comum ver os bissexuais como pesssoas de sexualidade cambaleante, são como pessoas ingênuas que ainda não sabem do que gostam [e que não soe estranho encontrarmos homens e mulheres, de 30 anos ou até mais, procurando satisfazer curiosidades emergentes]; como pessoas que sabem mesmo o que gostam mas que não sabem é como encarar o fato, inclusive perante a sociedade [é como se ele antevisse a fúria do público caso não interpretasse seu papel devidamente] e/ou usam seus encontros heterossexuais para contradosar os outros encontros, tal como se se encontrassem numa balança. Tais casos obviamente acontecem mas as minorias sabem melhor que as maiorias o quanto os rótulos costumam ser cruéis.

Se nos afirmamos homossexuais, então nos vêem como sapatões e 'viados [abreviação de "desviados", o que, em si, já sugere muito]. Os esteriótipos não são mais brandos neste caso e este é um motivo a mais para não dizer ao público qual papel interpreta. Mesmo os próprios homossexuais, e isto constitui fato curiosíssimo, confessam surpresa frente ao conhecimento de que certo alguém, aparentemente tão homem, seria homossexual. Decerto deveria ele usar vestido e maquiagem? A questão também abrange o outro extremo: quão censurável pode ser um ou uma homossexual com hábitos contrários aos respectivos gêneros? Fulana não deveria ser tão machona e Cicrano deveria rebolar menos.

Mas na verdade, frustados estamos ao nos darmos conta de que a gramática de "homossexualismo" é confusa [e quem sabe até do heterossexualismo também]. Ser homossexual pode significar: se sentir atraído sexualmente por outro do mesmo sexo; manter relações sexuais com os do mesmo sexo. Dentro desta bifurcação há confusão maior quando se leva em conta as variações decorrentes de cada caminho e de suas combinações. Logo, muitas vezes o uso do "homossexual" está em completa obscuridade. Além disso, o próprio fenômeno encontra-se ainda em densa névoa por parte do vulgo que se embaraça na tentativa de buscar-lhe esta ou aquela causa.

Consideremos o sentido mais simples e claro do termo [homossexual enquanto pessoa que sente atração e se relaciona com pessoas do mesmo sexo]. Prossigamos.

Constituindo grupo à parte, mais uma minoria, os homossexuais fazem questão de afirmar sua presença ignorando se ela é chocante ou não. Aqui fiz uma referência indireta mas que agora esclareço: Nanny People, artista conceituada até mesmo pela sua opinião elevada, não esconde de ninguém o que pensa da Parada Gay [Paulista, por certo]. Ao que parece foi sua mentora nos primórdios do evento, expressando por meio dele, reclamações políticas e legais. Ela nos coloca que hoje a festa já não tem mais esse sentido como baluarte, mas o lado cívico tornou-se mero acessório, talvez um pretexto mais sério para a realização do evento. O espírito gay não deve desaparecer das paradas: as cores e trajes berrantes, a música contagiante, a alegria e comicidade peculiares, a maneira positiva de encarar a vida, expressões de afetividade entre pessoas do mesmo sexo, enfim. Mas não deve ser a manifestação confundida com a causa pois as manifestações públicas são realmente meios válidos e autênticos de luta contra o preconceito.

Aliás, falar em preconceito nos meios Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transexuais["GLBT", mais atualmente usado que o conhecidíssimo "GLS" [Gays, Lésbicas e Simpatizantes]] seria semelhante a entrar numa casa de espelhos, onde raios de desprezo se lançam de todos os lados para todos os lados causando distorções e produzindo figuras estranhas e disformes. Normalmente existem richas internas entre os grupos, ocorrendo até mesmo no seio dos próprios, onde existem por vezes a calúnia pelo cochicho. Alguns "discretos" por exemplo, odeiam as "bichinhas".

Portanto não faz sentido reclamar em manifestações vazias em política e mérito. É como se estivéssemos diante de uma "ética das reclamações" e nos inclinamos a dizer a atitude reflexionante foi deixada de lado. É mais fácil exigir do outro que me respeite sem que no entanto eu mova um dedo sequer para fazer-me respeitar: lembremo-nos: respeito não se ganha, se conquista.

O ou a homossexual é parte de minoria, mas não grupo parteado da espécie humana e da civilização. Há de se projetar uma assimilação dos mundos dissonantes, uma nova síntese, pois somos todos particulares na multidão eterna. O grande grupo deve, assim, assimilar digestoriamente o complexo que lhe é exterior.

Nesta discussão é interessante tratar dos armários que prendem ainda aqueles que possuem uma opção sexual incomum. Como poderíamos ver a situação? Uma perspectiva: a falta de autenticidade dos sujeitos levam-os a temerem represálias pelas suas formas de expressão frente à sociedade. A saída é infiltrar-se nela, fazer parte sem abrir mão da sua condição.

Deixemos a concha do partidarismo e mergulhemos no grande mar da diversa humanidade: manifestação consciente, futuro sem hermetismo.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Considerações breves sobre a loucura em Michel de Montaigne



Avidamente temos tentado definir um critério que permita sugerir um limite entre a razão e a loucura.
Busquemos luz para uma possivel metodologia em Michel de Montaigne [Ensaios, Capítulo XII]:

Quem ignora quanto é imperceptível a linha de demarcação entre a loucura e as inspirações mais ousadas de um espírito completamente livre, ou as resoluções que pode tomar, em dadas circunstâncias, uma virtude excepcional?

De fato, dentre tantas definições de loucura, podemos apontar uma referente à falta de limites. A "lógica maluca" do desvairado, já é, em sua aplicação gramática, desordenada por natureza: Montaigne nunca deixa de lembrar aos seus leitores qual o papel do homem perante a lei, seja ela de qual natureza for. Mas nos encontramos frente à um quadro complicado, suas cores são histéricas e orgulhosas; seus contornos são fortes, mas vagos. Tal metáfora é uma pintura do humano.

A lei é, frequentemente, para nós, antes problema que solução e nos debatemos dentro dela assim como o peixe se debate ao mergulhar no nosso mundo atmosférico. Estado de coisas assim faz parecer os humanos seres anárquicos por natureza, desde o berço. Esta agonia se projeta em práticas sociais mais ou menos teóricas, desde os comunistas ou punks. Verdadeira andarilhidade somos forçados a imitar hoje, quando o nada é a instituição querida da humanidade e a ela devemos nossa salvação enquanto espécie biológica.

A generosidade do nosso ego é tão grande, mas, por outro lado, tão voltado a si próprio que por isso mesmo julgamo-nos livres: faremos bem em admiti-lo? Relembrando o pensador francês, a liberdade é condição dos loucos, desvinculados por completo das regras sociais [e então um visionário poderia passar facilmente por louco]. Entretanto, os homens de ciência muitas vezes pretendem uma desvinculação análoga e se julgam donos de si mesmo e de toda a verdade, acima de qualquer autoridade. Seu pensamento é límpido e suas proposições infalíveis. [A vergonha que essa posição engendra nos últimos momentos da vida de um homem é comovedora. Temos tido notícias, desde a antiguidade, de figuras sisudamente teimosas : totalmente impenetráveis. Mas o destino cuidou muito bem delas e as fez recuar diante de tão custosas posturas. Uma curvatura não por consciência mas por força da intempérie vital.]

Desta forma, a loucura e a prepotência encontram-se lado a lado e a filosofia vazia dos sábios de ciência torna-se doidice aos olhos de Deus, conforme insistem os crentes. Sábio verdadeiramente foi Sócrates, afirmando que na verdade nada sabia, compreendendo que a porção de seu saber era insignificante frente à porção da sua ignorância.

Queremos e pretendemos tudo saber quando ignoramos até mesmo nossa natureza íntima e não me refiro aqui às noções distribuídas pela física e pela biologia. Do outro lado dos empirismos. encontramos a metafísica, aquela capaz de acenar uma esperança ao menos. Pois nada nos dizem, neste sentido, as constituições moleculares e celulares. Nossa ética sumiu e estamos procurando por outra melhor, que seja bem natural, produzida em laboratório. Ela transformou-se em bons modos à mesa. O mundo está às claras, mas quem o contempla?

Enquanto na ética a loucura está no sujeito, no materialismo encerra-se sob as disfunções nas disposições orgânicas e nos dispositivos químicos. Ele destituiu o ser humano de sua condição própria de sujeito e transforma-o em aglomerado fisiológico, submetido à lei do instinto disfarçado de psicologia comportamentalista. A lei do comportamento, pelo visto, é a lei mater.

Portanto a razão já aparece como uma forma louca de manifestação do humano. A sabedoria, em seu sentido máximo, e a superação dos racionalismos, é o conhecimento holístico interior, que parte de dentro para o mundo; não se confunde com o pensamento vulgar seja ele refinado ou não. A habilidade de pensar, por si mesma, e de forma estritamente racional, não pôde salvar o homem de seu trágico destino: o da dor, da angústia e da morte.

Aliás, hoje, muito se fala na superação da morte nas perspectivas científicas por técnicas inovadoras. Enquanto o código genético humano é decifrado, vamos esperando, qual mendigos famintos em busca do pão, a vida eterna [tão reportada em textos sagrados, agora podemos comprá-la comodamente em algumas prestações de...]. Ela seria a resposta para todos os medos da humanidade e a chave da felicidade, linda felicidade! Fugindo de seu maior medo, o homem é rebaixado de mengido à vira latas medroso.

Entretanto, poderá mesmo o fim da morte livramo-nos de nós mesmos, dessa outra parte podre que insiste em feder? A despeito do uso abusivo de drogas especializadas na química cerebral, o sujeito findará por permanecer. E enquanto houver sujeito haverá lacuna. Tornaremo-nos imortais, ascendendo aos olimpos divinos... que então iremos fazer? Nossas angústias, logo depois que o comprimido de prozac calar, nos levará à conclusão de que seríamos... não mais felizes, mas pelo menos, quem sabe, menos infelizes.

O louco será mais louco que o inflado douto?